Particular/ geral
Do senso comum resulta um conhecimento particular, restrito a uma pequena amostra da realidade, a partir da qual são feitas generalizações muitas vezes apressadas e imprecisas. Os dados observados costumam ser selecionados de maneira não muito rigorosa. Em outras palavras, conclui-se para todos os objetos o que vale para um ou para um grupo de objetos observados.
Já as conclusões da ciência são gerais no sentido de que não valem apenas para os casos observados, e sim para todos os que a eles se assemelhem. Afirmações como "o peso de qualquer objeto depende do campo de gravitação" ou "a cor de um objeto depende da luz que ele reflete" ou ainda "a água é uma substância composta de hidrogênio e oxigênio" são válidas para todos os corpos, todos os objetos coloridos ou qualquer porção de água, e não apenas para aqueles que foram objeto da experiência.
A diferença entre elas deve-se ao fato de que as afirmações do senso comum são assistemáticas, enquanto as explicações da ciência são sistemáticas e controláveis pela experiência, o que permite chegar a conclusões gerais. Se o saber comum observa um fato a partir do conjunto dos dados sensíveis que formam nossa percepção imediata, pessoal e efêmera do mundo, o fato científico é um fato abstrato, isolado do conjunto em que se encontra normalmente inserido e elevado a um grau de generalidade.
Fragmentário/ unificador
Em comparação com a ciência, o conhecimento espontâneo é fragmentário, pois não estabelece conexões em situações em que essas poderiam ser verificadas. Por exemplo: pelo senso comum não é possível perceber qualquer relação entre o orvalho da noite e o "suor" que aparece na garrafa retirada da geladeira; nem entre a combustão e a respiração (que é uma forma de combustão discreta relacionada à queima dos alimentos no processo digestivo para obter energia). Se dermos crédito à velha história, é interessante lembrar as circunstâncias em que Isaac Newton teria intuído a lei da gravitação universal. Ao associar a queda de uma maçã à "queda" da Lua. Aliás, o caráter unificador dessa teoria nos permite associar fenômenos aparentemente tão díspares como o movimento da Lua, as marés, as trajetórias dos projéteis e a subida dos líquidos nos tubos delgados.
Subjetivo/ objetivo
O senso comum é frequentemente subjetivo, porque depende do ponto de vista individual e pessoal, não fundado no objeto, e condicionado por sentimentos ou afirmações arbitrárias do sujeito. se temos antipatia por alguém, é preciso certo esforço para reconhecer, por exemplo, seu valor profissional. Ao observar o comportamento de povo com costumes diferentes dos nossos, tendemos a julgá-los baseados em nossos valores e considera-los estranhos, ignorantes, engraçados ou até desprezíveis.
O mundo construído pela ciência aspira à objetividade. É objetivo o conhecimento imparcial, que independe das preferências individuais e que resulta da descentralização do sujeito que conhece, pelo confronto com outros pontos de vista. No caso das ciências, as conclusões podem ser testadas por qualquer outro membro competente da comunidade científica.
Ambiguidade/ rigor
Para ser precisa e objetiva, a ciência dispõe de uma linguagem rigorosa cujos conceitos são definidos para evitar ambiguidades. A linguagem tona-se cada vez mais precisa, à medida que utiliza a matemática para transformar qualidades em quantidades. A matematização da ciência adquiriu grande importância no trabalho de Galileu. Ao estabelecer a lei da queda dos corpos, po exemplo, Galileu mediu o espaço percorrido e o tempo que um corpo leva para descer o plano inclinado, e ao final das observações registrou a lei numa formulação matemática.
É bem verdade que o mesmo não ocorre com as ciências humanas, cujo componente qualitativo não pode ser reduzido à quantidade. Algumas delas, como é o caso da psicanálise, não fazem uso da matemática ou da experimentação, embora outras teorias psicológicas, como as comportamentalistas, recorram não só às experiências em laboratório como à matemática e à estatística.
Fonte: Filosofando - Introdução à Filosofia. Maria Lúcia de Arruda Aranha, Maria Helena Pires Martins.